Para quem precisa – Editoral da Folha de hoje – 25.10.2012

Excelente argumentação constante do editorial da Folha de hoje, onde questiona a função das penas atribuídas aos réus do mensalão… Este assunto, bem como o núcleo da argumentação utilizada, foi e está sendo abordada na cadeira de Direito Penal deste semestre.

Se o Brasil estivesse em ‘CNTP’ (condições normais de temperatura e pressão), ou seja, com uma democracia consolidada e um nível cultural avançado, talvez se aplicaria, em sua totalidade, a tese levantada pela Folha, entretanto, creio que o nosso país precisa passar por um ‘choque de ética’, para que os nossos políticos e, por conseguinte, toda a população reveja os seus valores com relação aos crimes ora em julgamento no mensalão… Por mais severas que estejam sendo as penas aplicadas aos réus desta ação penal 470, seria muito mais prejudicial para a nossa sociedade, no atual estágio de ‘amadurecimento democrático’ que encontramos, a absolvição ou a aplicação de uma dosimetria mais branda; sob pena da completa banalização dos crimes associados a usurpação do erário público.

Esta matéria foi indicada/sugerida, via e-mail, pelo Dr. Fábio Mafra.

Para quem precisa

Penas de prisão deveriam, em tese, caber a criminosos violentos; para os demais, como no mensalão, conviriam severas penas alternativas

Os crimes são cometidos mediante violência ou fraude. No primeiro caso, só resta à sociedade prender os infratores -são perigosos demais para continuar à solta. Será adequado tratar todos os demais do mesmo modo?

Esta Folha tem argumentado que não. Há mais de dez anos, portanto muito antes do mensalão, sustenta-se aqui que a pena de prisão deveria ser destinada, em tese, aos que recorrem a violência física ou grave ameaça na consecução do delito de que são culpados.

As condições na maioria das cadeias brasileiras são abjetas. Mas a sociedade continua a abarrotá-las de indivíduos, condenados por juízes que fecham os olhos, como a efígie da Justiça, para a norma constitucional que proíbe “penas cruéis” e “tratamento degradante”.

São mais de 514 mil presos no país, num sistema que comporta 306 mil. Ao mesmo tempo, 153 mil mandados de prisão aguardam ser cumpridos, conforme o eufemismo judicial. Celerados estão livres, enquanto uma parcela de criminosos que não oferece o mesmo risco está detida.

Dizer que a prisão deveria reeducar é outra falácia. Claro que é preciso aumentar o número de vagas nos presídios, torná-los compatíveis com um país civilizado e compelir os detentos a trabalhar. Mesmo na Suécia, porém, os cárceres fazem jus ao clichê de que toda prisão é uma universidade do crime.

Constatá-lo não implica complacência. Delinquentes violentos devem ser submetidos a longuíssima privação de liberdade, e a progressão dessas penas deveria ser até mais difícil do que é.

Quanto aos outros, não faltam medidas duras à disposição do juiz: impedimento duradouro de exercer cargo público ou determinada profissão, restituição dos valores subtraídos e prestação de serviços à comunidade, que podem se tornar encargos severos quando prolongados -e são verificáveis pelos recursos da tecnologia eletrônica.

A indignação pública perante o escândalo do mensalão se expressa, contudo, no legítimo anseio de ver os culpados atrás das grades.

Sempre houve corrupção política, mas o governo Lula a praticou em escala sistêmica, sob o comando da camarilha então incrustada no ápice do Executivo e do partido que o controla. As punições hão de ser drásticas, e seu efeito, exemplar, mas sem a predisposição vingadora que parece governar certas decisões (e equívocos) do ministro Joaquim Barbosa.

Tendo arrostado um partido que continua no poder e cujo chefe desfruta de imensa popularidade, seria decerto pedir demais ao Supremo Tribunal Federal que fosse ainda além, condenando nosso sistema prisional ao evitar que esses réus sejam despachados, sem motivo inarredável que não a letra da lei, para o inferno das cadeias.

Tal desfecho estaria sujeito a interpretações perniciosas. Ignorou-se a lei, tudo termina em pizza, diriam muitos. Evitou-se que os mensaleiros se façam de mártires encarcerados, diriam outros. Nem por isso a prisão desses criminosos terá sido necessária.

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